segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

" Me sentia completa pela metade..."



Este é um relato que eu não gostaria de postar, me causa dor, tristeza e revolta, mas acho que todos precisam saber das profundas cicatrizes físicas e psicológicas que são causadas pela violência obstétrica...

Com certeza o caminho mais seguro para se conseguir um parto humanizado(ser tratada com respeito e ser protagonista de seu próprio parto) é contratar um profissional GO ou EO humanizado, mas infelizmente às vezes isso não é possível e muitas vezes essas parturientes caem nas mãos de uma equipe totalmente "desumanizada" e o que deveria ser o momento mais lindo de sua vida torna-se um pesadelo!

Eu já atendi várias gestantes nessa caminhada de doula, algumas  o vínculo foi apenas no momento do parto e depois se tornam apenas doces lembranças, mas outras se tornam muito mais que minhas doulandas, se tornam minhas amigas queridas, e assim foi com a Vanessa, nos tornamos muito próximas e por isso foi muito difícil ficar do lado de fora do centro obstétrico...

Vanessa querida, não precisa pedir perdão por nada, eu sei que te orientei à fazer de outra forma, seguir um outro caminho, mas o parto era seu, você tinha seus medos e receios, e como você disse, era sua primeira vez, nunca havia passado por isso e achou que se tinha um plano de saúde, deveria poder contar  com isso! Não foi você quem errou, foram os profissionais desqualificados, foi a instituição despreparada, foi o sistema obstétrico desumano e injusto de nosso país...

" A maior dor não vem das contrações, a maior dor vem dos maus tratos, do desrespeito, da invasão, da falta de amor, a maior dor vem da alma..."

Segue abaixo o relato:



Então, chegou a hora de botar pra fora a experiência do melhor e do pior momento da minha vida: O nascimento do meu príncipe.

Já estou devendo este depoimento pra Carla faz tempo (quase 10 meses), mas eu nunca soube se eu não o escrevia porque realmente não tinha tempo, ou por medo de relembrar tudo.

Durante o final da minha gravidez eu ouvi falar sobre violência obstétrica. Tudo o que eu pude pensar é: “Nossa, eu não quero passar por isso”. Mas, adivinhe? Eu passei.

Passei, e tudo ficou ecoando na minha cabeça por muito tempo. Cheguei a ter pesadelos.

Enfim, vamos resumir...



Descobrimos a gravidez quando eu estava de 7 semanas. Foi uma mistura de sentimentos, porque não foi planejado. Não por nós, pelo menos. Mas, por Deus.

Tive uma gravidez complicada, conturbada... Desenvolvi hipotiroidismo, e fui encaminhada pra gestação de alto risco. Entendam, o problema não era o meu filhote. Nunca foi. O problema foi que eu estava rodeada de pessoas que não queriam o meu bem. Então, acabei vivendo um inferno. E, ainda por cima, pra piorar tudo, perdi meu pai quando estava de 4 meses. Foi tudo muito difícil, muitas vezes eu pensava na injustiça que Deus estava fazendo comigo, mas, na verdade, ele me deu esta vidinha linda justamente pra amenizar a dor que eu viria a sentir.

Durante a gravidez de ‘alto risco’, passei por vários médicos do plano de saúde. Até que fui parar nas mãos da pessoa mais mal preparada pra cuidar de uma gestante. Consultei com a senhora ‘açougueira’ uma semana depois de perder meu pai. E ela foi grossa, estúpida, inconveniente. Na hora, eu sai do consultório chorando e registrei reclamação no SAC do tal plano. Porém, como sabemos, eles não tomaram atitude alguma. Fui encaminhada pra outro GO, que era mais perdido que ‘cego em tiroteio’. Mas eu, muito leiga e ignorante de conhecimentos, como mãe de primeira viagem, segui consultando com ele.

Quando eu estava de mais ou menos uns 8 meses, me deparei com artigos e mais artigos falando sobre a tal Violência Obstétrica. Coisa que eu não conhecia. Como não tinha alguém pra me orientar, eu sugava a internet. Li coisas terríveis e só conseguia pensar comigo: “Meu Deus, eu NÃO quero passar por isso, que coisa horrível! Onde já se viu tratar uma mulher dessa forma??”

Continuei me informando e informando, até que descobri um grupo que realizava encontros de gestantes. Lá fui eu, toda louca, na grande saga em busca de informações. Neste dia eu já estava de 36 semanas, e foi quando conheci a Carla! O grande anjo que me ajudaria. Eu nem sabia direito o que era uma Doula, mas fui pegando as informações aos poucos, sem perguntar muita coisa, com medo de parecer burra demais. A Carla conversou comigo, super atenciosa, e me orientou sobre algumas coisas que eu ainda tinha dúvidas (ela me orientava melhor que o GO). Peguei o contato dela e foi aí que eu senti que estava bem amparada. Ela me deu todo o suporte que eu precisei, me tirou todas as dúvidas que eu tinha. E me orientou sobre o melhor pra mim e pro meu filho.
Eu não contei aqui ainda, mas, desde que descobri a gravidez, eu pensava no parto. E eu só conseguia me ver tendo parto normal. Por isso pesquisei tanto sobre a violência obstétrica. Porque ela ocorre muito mais nestes casos. Mas, desde o início, estava certa do que eu queria. O Parto Normal.
Durante o encontro do grupo de gestantes e das conversas que eu tinha com a Carla, eu conheci melhor o parto humanizado. Me apaixonei de cara. Sonhava com o parto lindo que eu queria ter.

Comecei a procurar uma GO humanizada pra me acompanhar no parto. E a Carla me ajudou nesta busca. Pena que não tivemos tempo...

Era uma sexta feira, e a Carla veio me dizer que achou a GO ideal pra mim. Me passou o contato e tudo mais. E eu disse que, na segunda feira, eu iria fazer contato e agendar a consulta. Eu estava de 38 semanas e 2 dias.
Passei a tarde bem, e, por volta das 18/19hs, comecei a sentir algumas dores diferentes. Meu tampão já havia saído há alguns dias, mas eu estava despreocupada porque sabia que o parto poderia ocorrer em até 15 dias. Mas as dores começaram a piorar. Tanto que eu acordei meu marido (que trabalhava a noite) e falei pra ele que achava que tinha chegado a hora. Até ele ficou meio assim, mas eu não sei porque, nós, mães, sempre sabemos. E eu sabia.
Falei com a Carla e ela me perguntou se eu queria ir ao hospital pra ser examinada e ter a certeza de que estava mesmo em trabalho de parto.
Passamos na casa dela e fomos ao ‘hospital’ que o meu convênio cobria. A Carla sempre me orientou a procurar o SUS, pois o parto humanizado deles dá de 10 a 0 em muitos hospitais particulares, mas eu estava surda. Não sei porque, não a ouvi... Foi o pior erro da minha vida!!! Acreditem!!!
Chegando no hospital, fui atendida e o médico veio fazer o ‘toque’. Senti muita dor e começou a sangrar. Ele disse que eu estava com 3 de dilatação, em trabalho de parto, e que era pra ir pra casa e esperar a dor piorar pra voltar ao hospital. Disse, também, que a dor pelo toque e o sangramento eram normais... Depois descobrimos que NÃO! Nesse momento, foi a primeira intervenção desnecessária que sofri. Ele rompeu a membrana, e mal sabia eu que iria sofrer com aquilo.
Enfim, voltando do hospital a Carla gentilmente perguntou se eu queria ficar na casa dela durante o TP, pois ela sabia os problemas que eu tinha em casa (não com meu marido, mas com outras pessoas).
Fomos pra casa dela, e ela me deixou a vontade. Fiquei horas e horas no chuveiro, conversando com meu marido, e bem tranquila. Saía do chuveiro, ela me fazia massagem, me deu café, perguntou se eu queria comer algo e eu até disse que queria fast food. Eu estava relaxada e tranquila, sabendo que o maior momento da minha vida estava acontecendo...
Porém, as contrações se intensificaram muito rapidamente, e o intervalo delas começou a ficar cada vez menor e menor. Como não sabíamos que o médico que me atendeu antes havia rompido a membrana (que é o que causou as contrações mais intensas e com intervalo curto), decidimos ir ao hospital pra ver se estava tudo ok.
Voltamos ao hospital de praxe, e mais uma vez te peço perdão por não ter te ouvido, Carla! Você quis o meu bem, mas eu não conseguia te ouvir, estava perdida, não sei explicar. Não sabia mais nem como se raciocinava... rs
Chegando lá, outro toque e o médico dizendo que ia me internar porque eu estava com 4 de dilatação. Passou os documentos pro meu marido ir fazer a internação e eu fiquei com a Carla. Comecei a chorar e falei que não queria ficar ali, e a Carla disse que eu poderia ir embora a hora que quisesse, que eu não era obrigada a ficar. Mas, nessas alturas eu já estava fora de mim, de tanta dor.
Fiquei pensando comigo: “Quando meu marido voltar, eu pego ele pela mão, a Carla pela outra, e vamos embora”. Mas, ele não voltou. Quem apareceu foi uma enfermeira muito estúpida, com uma cadeira de rodas (como se eu não pudesse andar) e praticamente me obrigou a sentar. Eu disse que queria ir andando, e ela respondeu, ríspida, que tinha mais o que fazer, e que se eu fosse andando iríamos demorar muito pra chegar no centro cirúrgico. Olha só!!
Pois bem, sentei na cadeira e fomos. No meio do caminho encontramos meu marido. Chegamos no CO, e tive que deixar a Carla. Eu estava com medo, assustada, sem saber o que ia acontecer, sem saber o que fazer, e nem ela, que era minha mão direita, nem meu marido, que era a mão esquerda, puderam entrar comigo. Eu falei que queria o meu marido e me enrolaram, falando que ele tinha que trocar de roupa pra entrar, mas que já já estaria comigo.
Entrei, me levaram pra trocar de roupa, me MANDARAM fazer as ‘necessidades fisiológicas’ porque ‘lá dentro eu não poderia fazer’...
Daí me levaram pra uma sala, me mandaram deitar, colocaram o aparelho do cardiotoco, e me largaram sozinha. Fiquei lá um tempão, e nada... A única coisa que acontecia era, vez ou outra, entrar um(a) enfermeiro(a) diferente pra fazer o toque. Nem sei dizer quantos foram. Fiquei lá, perdida e sozinha, em meio a um monte de aparelhos apitando e um monte de gente estranha. Me sentindo fragilizada ao máximo. Querendo sair correndo.
Até que entrou uma enfermeira, conferiu os aparelhos, e disse que era pra eu ficar tranquila, que ela já tinha ligado pra tal médica, e que ela já estava a caminho pra fazer meu parto. Paralisei na hora!!! A tal médica que viria, era a ‘açougueira’. Aquela que eu havia consultado durante a gestação, e me tratou mal. Era ela que iria fazer meu parto porque ela era a plantonista do alto risco daquele dia.
Não pude acreditar... Eu comecei a chamar meu marido, afinal de contas já estava lá há um tempão sozinha e nada dele entrar. Mas só me davam desculpas esfarrapadas...
Uma hora falaram que ele estava se trocando, ai questionei o tempo, daí falaram que ele ia levar as nossas coisas pro quarto em que eu iria ficar depois do parto. Perguntei em que andar ficava esse quarto e me disseram que era no mesmo andar em que eu estava. Então, comecei a questionar a demora dele entrar, já que já fazia muito tempo que eu estava sozinha. Comecei a encher o saco de todas as enfermeiras, falando que eu queria o meu marido, que eu queria, que eu queria... Até que, depois de muito tempo e insistência, ele entrou. Quando ele entrou eu já estava chorando, por saber que era a ‘açougueira’ que iria participar do melhor momento da minha vida. E então meu marido me mostrou a folha que FIZERAM ele assinar lá fora (disseram que ele tinha que assinar pra entrar, senão, não entrava). Na folha dizia basicamente que os médicos podiam fazer o que quisessem comigo, e que nada, ABSOLUTAMENTE NADA poderia ser questionado, tanto por mim, quanto pelo meu marido.
Na folha estava incluso também que eles poderiam sim fazer a episiotomia (que era o que eu não queria de jeito nenhum!!!) Li aquilo, entre uma contração e outra, e disse que queria ir embora. Até fui levantar da maca, mas veio a contração forte e voltei a deitar.
Enfim, eu teria que ficar, já era tarde demais...
Me mandaram ir pro chuveiro, e fui. Fiquei lá um tempão, com mil coisas passando na cabeça. Eu já estava fora de mim de tanta dor. E eu sempre disse pro meu marido que NÃO queria analgesia. Mas, no auge da dor, eis que vem uma enfermeira sorridente, dizendo pra eu sair do chuveiro, que eu iria tomar “remédio pra tirar a dor”... Meu marido ainda tentou me dizer que aquilo era algo que eu não desejava, mas eu já estava tão louca, tão doida, que só não fui correndo porque não dava. Maldita escolha errada.
Fui pra maca, me enfiaram ocitocina na veia pra acelerar ainda mais o parto e chamaram os “anestesistas”. Resumindo, levei mais de 10 picadas na coluna, até que a tal anestesia ‘pegou’. Pegou ‘mal pegado’. Nisso, a ‘açougueira’ chegou e começou a tocar o horror...
Logo depois de tomar analgesia, comecei a apagar (estava há dois dias sem dormir), e ela entrou na sala falando pro meu marido que se eu dormisse ela iria me levar pra cesária!

Meu marido me chamou e, quando ele falou isso, acordei na hora. Fiquei tentando me manter forte e acordada... Tentando pensar positivo. Mas, parece que nessas horas você nem controla mais os pensamentos. Era assim que eu me sentia, pelo menos.
A ‘açougueira’ veio, fez toque e disse que iria romper a bolsa. Eu já sabia que há bebês que nascem com a bolsa intacta, e eu queria que, se fosse pra ser, que ele nascesse assim, mas a resposta veio rápida e ríspida ‘Eu não acordei às 4h da manhã pra vir aqui e o seu filho não nascer. Você não quer que ele nasça?? Pra ele nascer, eu tenho que romper a bolsa!”
Me calei. Eu, que sempre fui boca dura, que nunca levei desaforo pra casa, não conseguia nem discutir com aquele protótipo de gente.
Ela rompeu a bolsa, e eu senti a dor. Falei que, mesmo com analgesia, eu estava sentindo tudo, e ela disse que era normal.
Ai ela examinou e disse que o bebê estava ‘alto’. Veio até o meu marido, pegou a mão dele, colocou em cima da minha barriga e disse: “tá sentindo isso? É uma contração. Quando você sentir isso, manda ela fazer força”. E saiu da sala.
Ficamos lá, eu e meu esposo, dois pais de primeira viagem, perdidos, sem saber o que fazer, desamparados, sem nenhum enfermeiro ou médico por perto.
As contrações estavam com pouquíssimo espaço de intervalo, então eu lembro que disse pro meu marido: “eu não vou pra cesárea, nem consigo mais distinguir as contrações, vou ficar fazendo força a todo momento, até ele descer”...

E fiz. Fiz muita, muita, muita força. Ali, nós dois, sozinhos. Força, força, força...
Passou um bom tempo até alguém entrar na sala, e era ela... Veio, examinou ( eu sentindo tudo), e disse que ele já tinha descido. Que era ‘hora’ de nascer.

Eu falei que queria ficar de pé, que estava com vontade de levantar, mas não deixaram. Me falaram até que meu filho poderia ‘cair no chão’ se eu levantasse, que eu era ‘louca’.

A ‘açougueira’, então, começou a se preparar para o parto. Colocou luvas, roupas, jogou aqueles lençóis azuis por cima das minhas pernas, e começou a tortura.

Eu dizia que sentia tudo, que a analgesia não tinha pegado, e ela teimava que era impressão. Até que uma hora ela mandou chamar o anestesista, ele veio, perguntou pra mim o que eu estava sentindo, eu expliquei em meias palavras, e ele disse que era ‘normal’. Mas, aí a ‘açougueira’ interviu e mandou ele me dar mais analgesia, porque eu estava sentindo ‘até os dedos’ dela.

Tomei mais analgesia e nada... E aí falaram que era aquilo, e que não poderiam fazer mais.
Eu, com sede desde o início, ficava pedindo água, mas eles falavam que eu não podia tomar.
Eu suava, de tão cansada e de tanta força que fiz. Estava com a garganta seca, e não podia tomar nenhum gole de água...
Fiquei lá, estirada, morrendo de dor, não pelas contrações, mas pelo que a ‘açougueira’ estava fazendo. Me torturando fisicamente a todo segundo, com aqueles dedos, tentando ‘alargar’ a passagem...

Até que ela, mandando eu fazer força, puxou uma mesinha cheia de instrumentos cirúrgicos pra perto. Meu marido na hora se lembrou da episiotomia, e falou pra ela que eu não queria. Ela, mais que depressa, falou que se fosse preciso, iria fazer sim, pois era ela que escolhia ali!!
Disse que ele não estava saindo, e que me ‘daria’ três chances pra fazer força e ele nascer. E que, se ele não nascesse nas 3 tentativas, ela teria que fazer ‘o corte’.
Nesse momento, tudo o que eu pude pensar era que dependia de mim, e só de mim. Me esforcei e fiz a maior força que eu conseguia. Nada. Fiz de novo, e no final, soltei o ar pesadamente, o que soou quase como um grito de alívio, e aí ela disse, daquele jeito nada gentil: “SE VOCÊ GRITAR TEU FILHO NÃO VAI NASCER, VOCÊ TEM QUE FICAR QUIETA E FAZER FORÇA AQUI EMBAIXO.” Como o que soltei não foi um grito, e sim o ar de alívio, comecei a tentar não respirar direito, tentar trancar o ar. E fiz mais força. Ele não nasceu.
Então ela, novamente muito ‘educada’ (só que não!!!) falou que iria fazer a episiotomia. Eu queria gritar, sair correndo, pular da janela. Mas só consegui ficar ali, imóvel, sentindo a dor do bisturi me cortar. Afinal, a analgesia não fez efeito, lembra?

Logo, ela nem pediu pra eu fazer força, simplesmente enfiou o fórceps dentro de mim (me machucando toda) e puxou o meu filho.
Eu lembro que vi ele, todo molinho, no colo dela, e ela ‘enxugando’ ele como se fosse um objeto qualquer.

Um dos sonhos do meu parto perfeito era o desejo de que meu marido cortasse o cordão. Mas, ela nem sequer perguntou se ele queria. Foi logo cortando tudo, e largou o meu pequeno nos meus braços, todo molinho...
Eu nem sei descrever o que senti naquele momento. Esqueci tudo e só conseguia contemplar aqueles olhinhos tão pequenos e inocentes. Chorei. Ri. Fiquei aliviada. Fiquei feliz.
Pensando agora, eu entendo o quão forte é o amor de uma mãe, pois, em questão de segundos, esqueci toda a tortura que havia acabado de acontecer.

John nasceu com 3070 Kg e 47 cm, às 08:28h, de 21-02-2015.

Enfim, eu havia me tornado mãe. Enfim, eu estava com o meu tesouro mais precioso nos braços. Enfim, tudo acabaria e eu teria uma vida plena e feliz. Enfim, a felicidade chegou.

Mas, isso foi por poucos segundos. Tiraram meu filho do meu colo, e começaram a tortura com ele. Fizeram todos os procedimentos de praxe, enquanto ele gritava e gritava porque tudo o que ele queria era ficar protegido no meu colo. Judiaram tanto dele, que chegaram a cortar embaixo do nariz com aqueles caninhos, e foi tão profundo que chegou a fazer ‘casquinha’ depois. Inclusive tenho foto disso. Foto do seu primeiro dia de vida, com um machucado.

E aí o levaram de mim. Meu marido foi junto, mas não pode entrar no berçário. Teve que deixá-lo lá, sozinho, com estranhos, enquanto eu era ‘costurada’ no CO.

Nesse momento eu pensei que, como havia acabado, eu poderia tomar água, pois parecia que estava com a garganta cheia de areia, de tão seca. A enfermeira veio e jogou uma ampola de soro na minha boca. O que só piorou ainda mais a situação, pois o soro era salgado...

E eu só pensava que queria meu filho, que queria vê-lo, ficar com ele, protegê-lo, mas não pude. Depois da tortura da ‘costura’ e do soro goela abaixo, me levaram pra uma sala de recuperação e lá me largaram, sozinha, durante quase duas horas. E só depois me levaram pro quarto.

Meu marido não estava mais no hospital, ele teve que vir pra casa, mas logo iria voltar pra ficar comigo. Então fiquei no quarto, sozinha, sem meu filho, e sem saber que poderia pedir pro berçário que trouxessem ele. Eu sei o quanto isso parece ridículo, mas eu realmente não sabia. Era mãe de primeira viagem, estava zonza ainda de tudo o que havia acontecido. Eu não pensava mais direito.

Quando meu marido chegou é que ele foi buscar meu filho no berçário. Enfim, pude ficar com meu pequeno. Tudo o que eu conseguia fazer era admirar aquele rostinho tão lindo. Pensar em como eu me sentia completa pela metade. Isso mesmo. Eu era completa por ter o filho mais lindo do mundo, mas me sentia pela metade pela forma como tudo aconteceu e como fomos tratados.

E o pior não parou por aí. Tive problemas com amamentação, e, quando uma enfermeira da noite veio me ‘ajudar’ a amamentar, ela foi tão grossa, que meu filho começou a gritar, e mesmo assim ela enfiava a cabeça dele no meu peito. Moral da história? Tivemos que sair do hospital já dando leite artificial pro nosso pequeno.
Tentamos por semanas fazer a amamentação dar certo, mas não deu.

Sei que parece horrível ficar pensando em tudo de ruim que havia acontecido, já que tudo havia acabado e eu tinha um filho lindo, mas eu digo, só quem passa por um trauma desses sabe como é. E eu, infelizmente, sei.

E digo que, hoje, quase 10 meses após o nascimento do meu filho, ainda não superei esse trauma. Talvez, porque ele ainda povoe meus pensamentos, ou talvez seja mesmo pela dor física que ainda sinto. Sim, ainda sinto dores na episiotomia. Tanto, que não consigo ter relações e estou em tratamento pra ver se isso melhora.
Tudo isso sem contar o trauma psicológico que ficou. O medo, os pesadelos, o sentimento de ser menos mãe por não ter conseguido parir, por não ter amamentado... É tudo muito, muito difícil.



Escrevo isso hoje com o coração em pedaços. Mas sinto que devo compartilhar esta história porque sei que eu não sou a única. Que, em algum outro lugar há alguma mãe lendo esta história e se identificando com alguma parte. Que também se sente só, e não sabe ou não consegue desabafar. Não sabe lidar com o sentimento. Não consegue esquecer e seguir em frente. E eu digo: Acho que é algo que vou levar comigo até o meu último suspiro. A lembrança do melhor e pior dia da minha vida.

À Carlinha só tenho a agradecer. Ela foi uma mãe, uma amiga, uma irmã, um anjo que Deus enviou pra tentar me alertar. Desde o início ela me orientou da melhor forma possível, e eu acabei passando tudo isso justamente por não ter ouvido ela.
Carlinha, me desculpe. Me desculpe mesmo. Se você soubesse o remorso que sinto por não ter te ouvido... =(


Enfim, sigo cada dia porque tenho um filho lindo, um marido que me entende e me completa.
E, acima de tudo, sigo porque Deus está comigo.





Vanessa Schlichting






quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Ela conseguiu...ela pariu!

 Quando eu e a Anie nos conhecemos foi tipo "amor à primeira vista"...hehe...a afinidade e cumplicidade foram instantâneas! E já no nosso primeiro encontro ela me disse que seu maior medo era de que ela não entrasse em trabalho de parto e acabasse em outra cesárea, mas eu a tranquilizei dizendo que ela entraria sim e que o seu GO sabia esperar o tempo de sua bebê...e assim foi, ela pariu lindamente! Parabéns mais uma vez querida, por sua garra, sua determinação e coragem para realizar o sonho do parto normal e natural! A Elisa e a Laís são muito abençoadas por ter uma mãe como você...
Foi um prazer te doular!
Segue abaixo o relato de parto:







Relato de parto nascimento da Laís

Para esse relato, eu não poderia deixar de contar do nascimento da nossa primeira filha. Isso foi em 2013, e naquela época se falava muito pouco em parto humanizado.
Desde o início da gravidez nutri esse sonho, ter meu bebê de parto normal e humanizado, mas hospitalar levando em consideração minhas inseguranças pessoais. Tinha entendido que um parto humanizado significava ser respeitada naquilo que eu me sentisse mais confortável. Procurei arduamente um médico humanizado em Curitiba e achei!! Fiquei muito feliz!! Esse mesmo médico me indicou sua doula e participei durante toda a gestação de palestras sobre parto, ministradas por essa doula. Essas palestras me abriram a mente. O que me deixava ainda mais fascinada com a ideia de ter um bebê naturalmente. A gestação foi ótima!  Fiz hidroginástica toda a gestação, me preparando. O tempo foi passando...39, 40, 41 semanas e nada de trabalho de parto. Até que meu GO, depois de me avaliar, sugeriu uma cesária. Na minha cabeça, eu estava nas mãos de um médico humanizado, que iria priorizar o parto normal, portanto, confiei nele. Triste, chorando, liguei pra doula já do hospital em que estava agendando minha cesária para informar a decisão. Minha filha Elisa nasceu em agosto de 2013 com 41+3 de cesária, muito saudável e minha recuperação foi ótima, mas eu não tive uma contração sequer. Superei a decepção de não ter tido um parto e segui ainda tendo a certeza do que é melhor para o bebê, mas lamentando não ter passado pela experiência.
Em 2015 me vejo grávida novamente. E tudo veio à tona. Infelizmente o antigo GO havia descredenciado meu plano, me vi então obrigada a buscar outro GO, mas, pelas minhas convicções, tinha que ser humanizado. Corri atrás de saber quais eram os demais obstetras humanizados de Curitiba. Fiz uma lista e fui ligando. Até que consegui marcar consulta com 2 desses médicos. O que tivesse horário antes, seria o escolhido. Então, com mais de 5 meses de gestação tive minha primeira consulta com o Dr Álvaro Silveira Neto. Gostei dele logo de cara, atencioso e muito tranquilo, me deu segurança que eu entraria em trabalho de parto. Até então, o meu grande receio era não entrar em TP e a história se repetir. O próximo passo seria achar uma doula, já que sabia que iria precisar de apoio emocional e físico. Pedi ajuda num grupo do facebook e me indicaram 2 doulas. Dei uma pesquisada básica e optei por entrar em contato com a Carla. Tenho muita fé em Deus e queria que essa pessoa tbm compartilhasse da mesma fé. Perfeito!! Carla é assim. Nosso primeiro encontro foi dentro do meu carro pq minha filha estava dormindo e não queria acordá-la e logo de cara tbm senti que era a Carla que iria me acompanhar dessa vez. A gestação foi tranqüila e eu sempre encucada e preocupada se eu entraria em TP ou se eu tinha algum  problema e que não teria essa experiência novamente. O GO e a doula sempre me diziam que cada gestação é uma. O Dr Álvaro ainda repetia, quase toda consulta, que iríamos esperar o tempo que fosse necessário. Nessa segunda gestação não participei de reuniões sobre parto, nem fiz exercícios para me preparar, afinal, com uma primeira filha a coisa fica mais difícil mesmo. Estava preparada para esperar até as 42 semanas ou mais!!!
Com 39+4 (uma quarta feira), comecei a sentir contrações de treinamento. Ai que felicidade sentir que minha segunda filha estava dando o ar da graça e logo viria. Sim! Era aquilo que eu queria sentir, vivenciar. Mas ainda não era a hora...como mãe de primeiro parto, já me animei toda e comecei a achar que estava em TP. Até comecei a contar as contrações, mesmo sendo indolores. Mandava whatsapp pra Carla achando que já estava na hora. Passei dias tendo esses pródromos, na esperança de que as contrações evoluíssem. Mas nada de evoluírem, onde estavam as dores?
Completei 40 semanas e a situação não mudava.
40+3 (terça feira, dia 03.11) e comecei a sentir uma dores nas costas, como quando estamos para menstruar. Era dia de consulta, fui ao consultório e o Dr me disse que eu ainda estava com 'cara de paisagem', definitivamente não estava em TP. Perguntou se eu queria fazer o exame 'por baixo' e eu disse que não (primeiro indício de que eu seria respeitada em tudo)... Achei melhor, não queria me decepcionar. No início da noite desse mesmo dia, as dores nas costas aumentaram. Tentei dormir, super feliz porque minha filha estava pra chegar.
Já era madrugada do dia 04.11 e não conseguia dormir. A dor nas costas havia aumentado e eu já não estava conseguindo ficar quietinha na cama. Sem nenhuma experiência, achei que estava em TP e eu e meu marido resolvemos ir para o hospital. Combinei com a Carla que, se chegasse lá e tivesse que internar, eu a chamaria. Tinha toda uma logística que precisava ser cumprida caso eu ficasse internada...minha filha tinha que ir para a avó ou meus pais ficariam em casa com ela, caso estivesse dormindo, enfim, essa ida para o hospital definiria tudo.
Chegando lá, uma médica me atendeu, mediu o colo e eu estava com 1 de dilatação. Quê??? - pensei - só isso?? Que decepção!!!
Voltamos pra casa.
De manhã bem cedinho, ainda com dores, resolvemos voltar ao hospital. Chegando lá, a médica avaliou e disse: "2 para 3 de dilatação e colo fino". Ligou pro GO que disse não ter necessidade de internar naquele momento, mas deixou a decisão comigo (segunda vez sendo respeitada em meus desejos). Ahh, mas eu não conseguiria passar aquelas dores em casa. Enfim, internamos dia 04.11 às 6 da manhã. Logo chamei a Carla que foi para o hospital assim que fui internada.
Pronto! Cenário montado, que comece a ação. Dores pra cá, dores pra lá... Eu achando que já estava no limite da dor, mal sabia o que estava por vir. Bola pra cá, massagem pra lá, dores...bolsinha de semente quentinha (como aliviava), abraço do marido. Orações feitas pela Carla. Apelei pra tudo que poderia me aliviar a dor. Mas ainda muito feliz de vivenciar aquilo.
Estavam eu, meu marido e a Carla com uma grande incógnita, quanto será que evoluímos na dilatação. Decidimos que esperaríamos até meio dia pra chamar alguém pra medir. Ás 11:30 o Dr. Álvaro chega. Me olha e diz "vc não está em TP, ainda com cara de paisagem, internou cedo demais". Só dei uma risadinha sapeca de criança que aprontou. Aí ele fez o toque. 5 de dilatação. Comemorei!!! Mas ele foi claro, agora que estaria entrando em TP ativo. Pensei: " afff, vai doer mais ainda?!!". Sim!! E doeu!! Muito mais!!! A partir daí, já não me lembro de muita coisa, só que as dores vieram pra valer. Pude me alimentar o tempo todo, pelo menos até onde conseguia. Massagens e palavras de incentivo era tudo o que eu teria...e ainda bem!!! Sem isso eu não conseguiria. Mãos de fada da Carla e o olhar confiante do meu marido.
Me lembro de ir para o chuveiro umas 14:30 e comecei a sangrar um pouco, mais que o normal. Carla chamou o Dr Álvaro. Ele chegou e mediu novamente. 8 de dilatação!!! UFA!!! A partir daí eu já não respondia mais por mim. Fui pro chuveiro e comecei a ter vontade de fazer força de expulsão. Devido a esse sangramento do colo, o Dr. Álvaro decidiu que iríamos mais cedo para o centro obstétrico, me explicando calmamente o porque (mais um indício de respeito e cuidado). Chegando lá é que realizei que estava perto de conhecer a Laís. Assim que entrei, uma enfermeira me perguntou: 'vai usar analgesia?'. Eu, confiante, disse: 'não!'. Mas nem tinha tanta certeza assim. Antes do meu marido e da Carla chegarem, o Dr. Álvaro examinou meu colo e identificou de onde estava vindo o sangramento. Ele, muito calmamente, me disse que iria ficar observando, mas devido a esse sangramento, poderia ter que acelerar o parto (mais uma vez me explicando, caso tivesse que intervir). Eu só ouvia atentamente e confiava nele.
Me disse pra ficar à vontade quanto à posição (de novo, o respeito). Depois de tentar várias posições, me senti melhor no banquinho da Carla. Meu marido atrás, Dr. Álvaro à minha direita, e a Carla à esquerda. Todos me dando apoio, me respeitando, sem pressa. Ninguém estava ansioso, querendo que acontecesse logo. Sim, mais uma vez me senti respeitada, todos esperando o momento certo. Dr. Álvaro me dava instruções claras de onde fazer a força, Carla e marido dizendo que eu conseguiria e eu...ahh, eu na partolândia, dizendo que não tinha mais forças. Ficamos lá fazendo força por cerca de uma hora e meia, eu já estava muito cansada! Dr. dizia que poderia acelerar o parto se eu quisesse, mas enfatizava que ele não via necessidade (olha aí de novo o respeito). Em nenhum momento me ofereceu analgesia (pelo que me lembro), mas eu não estava em condições de optar por nada, eu só pensava na próxima contração e se Laís viria ou não. Em certa altura, Dr. Alvaro pede para eu sentir com a mão a chegada da Laís, não tive coragem e não me perguntem porque. Minha bolsa estourou naturalmente e molhou todo mundo...foi engraçado. Até que decidi escorar meus braços no meu marido...bastaram 2 vezes e ela nasceu!!!! Que alívio! Que alegria! Que emoção! Deu tudo certo! Do jeito que sonhei! Dr me deu a Laís que veio toda molinha, chorando baixinho, corpinho quentinho... Inesquecível! Felipe e dr. Álvaro passando paninho nela e eu chorando, sem lágrimas. Carla tirando algumas fotos (ainda bem que tem o registro). Impossível descrever a emoção. No meio de tudo, Dr. Álvaro faz eu pegar o cordão e me pergunta se sentia pulsar. Eu senti, logo depois me pergunta se ainda está pulsando. Disse que não, então meu marido cortou o cordão (mais demonstração de respeito pelo bebê). Ao longe vejo o pediatra que assistia aquele nosso momento, veio até mim e perguntou se eu queria que Laís tomasse banho, respondi prontamente que não. Só tomou banho no dia seguinte. Felipe acompanhou Laís ao berçário enquanto eu paria a placenta e o Dr me dava os pontos necessários devido às lacerações (sim tive algumas, mas nada que me faça optar por uma futura cesária). Confesso que parecia bêbada, falando alto, queria abraçar todo mundo... Que efeito esses hormônios!!! E mais uma vez eu tive a certeza...sim! Era disso que eu estava falando, era isso que queria sentir no nascimento da minha filha. Essa loucura tão intensa e tão transformadora. Laís nasceu um pouco mais das  16:30 do dia 04.11.2015, com 3,165kg e 50cm de 40+4 semanas. Foram 5 horas de TP ativo, com pródromos iniciados uma semana antes.
Pois então, tive meu tão sonhado parto, sem nenhuma intervenção. Sem episio, sem manobra de kristeller, sem jejum, sem ocitocina sintética, sem rompimento de bolsa, sem tricotomia, sem analgesia, na posição que me senti mais confortável e no local que me senti mais segura
Nunca fui ativista pelo parto humanizado, era um desejo pessoal, mas depois disso, acredito que toda mulher deveria passar por essa experiência. Acho que não deveria existir outro tipo de parto que não seja o humanizado (sendo cesária ou não). Em que mamãe e bebê são tratados individualmente e respeitados em seu tempo, desejos e necessidades.
Agradeço de coração pelos anjos que me acompanharam: Dr. Álvaro - médico competente, atencioso, extremamente ético em seus procedimentos; Carla - mãos de fada, temente a Deus, ama o que faz e por isso faz de coração; Felipe, meu dedicado marido, mesmo tendo todo o suporte técnico, o suporte de amor dele foi essencial. Sem vocês eu não conseguiria e meu desejo é que todas as mulheres que tiverem seus filhos, tenham experiência de serem respeitadas em um momento tão único e particular de suas vidas. Deus é perfeito em tudo, com o parto pude experimentar um pouco mais de sua perfeição.
Anie Sogocio Couto